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O FALSO PODER DE DISCORDAR

  • Danilo Figueira
  • 26 de mai. de 2018
  • 4 min de leitura

É impressionante como esta geração está treinada para discordar! As pessoas, de uma forma geral e sem nem mesmo perceberem, antes de fazerem qualquer avaliação do que lhes é proposto, tendem a se colocar na defensiva e protestar. É como se "ser do contra" lhes desse poder ou as fizesse mais notáveis no seu mundo.

Vivo as consequências desta "onda" quase todos os dias. Como sou um comunicador e uso sistematicamente as redes sociais para compartilhar valores cristãos, sofro com os estilhaços dessa intolerância latente em tanta gente. E se você pensa que me refiro à rejeição que o mundo sem Deus tem à ética cristã, engana-se. Boa parte dos que fazem questão de contradizer, senão a maioria, encontram-se entre os "da fé". Foi-se o tempo em que as "patrulhas" eram marca exclusiva de grupos politicamente fanatizados. Hoje, muitos professos cristãos nem precisam de um tema realmente polêmico para rosnarem, beligerantes. Basta que alguém diga algo e logo aparecerão para responder: "Eu discordo".

Preciso logo abrir um parêntesis, para não ser mal entendido. "Julgar todas as coisas" é um conselho bíblico, registrado em I Tessalonicenses 5:21 e que, obviamente, devemos seguir. O crente não tem que se prestar como massa de manobra nas mãos quem quer que seja, por conta da superficialidade ou preguiça analítica. Antes de comermos alguma coisa, é bom avaliarmos do que aquilo é feito. Portanto, não estou propondo que abramos mão da virtude dos bereianos, vivendo como "vacas de presépio", dizendo "sim" a tudo o que ouvimos. O que pretendo defender aqui é que partamos sempre da boa vontade em tentar compreender o que o outro quer dizer, que nossa primeira intenção seja buscar um ponto de convergência e não de divergência. Ao invés de precipitadamente dizermos "eu não penso assim", que façamos o esforço de procurar um ângulo de onde a fala alheia possa fazer algum sentido para nós. Afinal, o conselho de Paulo não foi apenas que julguemos todas as coisas, mas também que retenhamos o que é bom. Quando, apressadamente, já nos apresentamos em oposição a tudo, acabamos por desprezar e até combater aquilo que é precioso, que só precisava de boa vontade para ser compreendido.

Eu acredito que essa "fissura" por discordar quase sempre nasce da soberba carnal, tão profícua na natureza humana. Na verdade, suas raízes vêm de muito antes de nós, quando um querubim chamado Lúcifer resolveu, não apenas se opor ao que Deus propunha, mas defender diante dos anjos o seu ponto de vista. Nasceu ali a rebelião, mãe de toda confusão que há no Universo. Tentando ser poderoso pela divergência, reivindicando a liberdade de pensar por si só e idolatrando a própria independência, Satanás se assumiu como maioral de um império que já nasceu falido. Desde então, seu grande estratagema é fomentar a ilusão de que a oposição pura e simples é prova de poder, disseminando a mentira de que independência é sempre sinônimo de soberania, quando na verdade é a base da anarquia.

A proposta do Reino de Deus é e sempre foi diametralmente inversa. A Trindade é uma concordância eterna na diversidade, um Deus que subsiste desde sempre e para sempre em três Pessoas distintas - Pai, Filho e Espírito Santo - mas que nunca deixam de ser um, de falar e sentir a mesma coisa. A própria obra de Cristo, cujo ápice foi a Cruz, é resultado um grande e penoso "amém" do Cordeiro à vontade do Pai, ecoando no mundo dividido pelo pecado, confrontando os homens em sua rebelião, desafiando os senhores de si mesmos, donos do próprio nariz, mas que morrem aos poucos, asfixiados pelo ar viciado das bolhas que criaram para não terem que assentir ao pensamento de ninguém.

O que Jesus nos ensinou foi o poder da convergência: "Se dois de vós concordarem na terra acerca de qualquer coisa que pedirem, isso lhes será feito por meu Pai, que está nos céus" (Mateus 18:19). O impacto da igreja que nasceu em Jerusalém passava essencialmente pela unidade: "Perseveravam na doutrina dos apóstolos e na comunhão, no partir do pão e nas orações... Todos os que criam estavam unidos e tinham tudo em comum... Perseverando unânimes todos os dias no templo, e partindo o pão em casa, comiam com alegria e singeleza de coração..." (Atos 2:42,44,46). A unanimidade, como se vê, conceito inaceitável para os escravos da dissonância, era o estilo de vida dos primeiros e tão influentes cristãos.

A cultura implantada e fomentada pelos primeiros apóstolos no meio do povo de Deus foi a da concordância, da cooperação, da unidade. Certamente consideravam as palavras de Jesus, quando disse: "Um reino dividido não pode subsistir..." (Mateus 12:25) e orou: "Pai, que eles sejam um, como eu e tu somos um, para que o mundo creia que tu me enviaste" (João 17:21). Por isso, havia um constante combate à dissensão. Paulo deu instruções muito diretas sobre o tema: "Sede unânimes entre vós; não ambicioneis coisas altivas mas acomodai-vos às humildes; não sejais sábios aos vossos olhos" (Romanos 12:16-17)... "Completai o meu gozo, para que tenhais o mesmo modo de pensar, tendo o mesmo amor, o mesmo ânimo, pensando a mesma coisa" (Filipenses 2:2); "Ao homem faccioso, depois da primeira e segunda admoestação, evita-o, sabendo que esse tal está pervertido, e vive pecando, e já por si mesmo está condenado" (Tito 3:10-11).

Precisamos nos alinhar ao estilo de vida da Palavra. Que nossos protestos sejam guardados para quando forem realmente necessários. Que o silêncio seja a nossa alternativa às polêmicas infrutíferas e que, acima de tudo, dizer "amém" volte a ser um sinal de grandeza e visão espiritual.


 
 
 

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AUTOR

Danilo Figueira, escritor, conferencista e pastor sênior da Comunidade Cristã de Ribeirão Preto, casado com Mônica e pai de Monique e Gabriel.

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